quinta-feira, 16 de setembro de 2010

1 clipe para cada ano de vida

Hoje é meu aniversário. Faço 40 anos e venho assistindo a videoclipes há quase trinta deles. Para comemorar, resolvi listar alguns dos meus preferidos. Os motivos para a inclusão dos clipes nessa primeira lista do Videonista foram os mais variados desde o pertencimento à minha memória afetiva até a excepcional qualidade de alguns destes trabalhos. Aproveitem!

Ah sim! Notem que eu criei links para todos os videoclipes (nenhum trabalho adicional para meus leitores, portanto). Além disso, em algumas páginas oficiais, a data de copyright dos clipes pode diferir da data de produção/exibição que eu informo aqui.

Clássicos

Esses clipes me lembram tardes de domingo de tempos pré-MTV (no Brasil). Canais (abertos) de televisão concentravam a programação videoclípica nesse turno e era só mudar de canal para ver diversos programas especializados: Clip Clip, Clip Show e  outros tantos dos quais nem lembro o nome. As tardes eram tensas, porque eu tinha que ficar a postos para gravar meus preferidos em VHS sem perder o início do clipe. Depois, era  só rever obsessivamente. Foi assim que me deparei com o cantor inglês que se veste de mulher (assim foi descrito Boy George em apresentação chocada do Fantástico), com a energia de Cyndi Lauper (prova viva de que ser diferente não significa ser estranha ou fake)  e com a polêmica de Madonna (condenada pela Pepsi e pelo Vaticano… quem mais desafiava, ao mesmo tempo, o capitalismo e a religião? rs). Além disso, havia um certo alento ao intuir sobre o que cantava o Pet Shop Boys (muitos anos antes de qualquer assunção – deles ou minha).



Todo mundo dançando agora

Essa lista é somente um aquecimento para uma postagem futura sobre a importância das coreografias videoclípicas. O diretor Spike Jonze, por exemplo, é um dos que mostra, eventualmente, um fascínio por este elemento. Não somente Björk (como podem ver abaixo), mas também o ator Christopher Walken já foram colocados por ele para dançar. Além disso, o próprio Jonze inventou um alter-ego coreógrafo/performer só para aparecer dançando em um dos seus clipes.

O mais bacana é que nem é necessário ter um domínio equivalente ao demonstrado por Madonna e sua trupe em Vogue ou pelos  brilhantes (pré)adolescentes de Human, que foram  estimulados a esquecer sua técnica para dançar esquisito (algo perfeitamente alcançado). Basta somente ter vontade e coragem para encarar até o ridículo, tornando-o tocante ou estimulante como nos clipes do Kings of Convenience e Moby.



Contando histórias

Tendo em torno de cinco minutos de tempo disponível, os clipes podem não parecer os melhores veículos narrativos. Ainda bem que alguns realizadores insistem nesse caminho e o fazem com eficiência. Às vezes, é a utilização precisa da mise en scène que permite introduzir novidades e multiplicar desdobramentos na história, como na estrutura circular do clipe de Björk. Já no vídeo do duo The Chemical Brothers, a concisão narrativa vem da prontidão em definir a protagonista e seu entorno: com clareza, estão demarcadas sua posição de ginasta e todo o leque de preocupações envolvidas com o momento (preocupações familiares, a relação com a equipe esportiva e a “cara” da concorrência, uma antagonista oposta à heroína em aparência e atitude). Há ainda, na opção narrativa de Elektrobank, a originalidade de retirar um clipe para uma música eletrônica dos clichês de festa ou investimento abstrato.

A relevância de alguns clipes narrativos, por outro lado, decorre de sua capacidade de não se intimidar diante de temas sensíveis, como o da sexualidade e o preconceito. É o caso do trabalho da banda Sigur Rós aqui incluído. Há ainda os que apelam para sentimentos humanos bem básicos: como não se mobilizar, em Crystal Ball, com o desespero do personagem de Giovanni Ribisi ao não ser mais reconhecido pela família e colegas? Como não sentir um prazer catártico com a vingança bem aplicada de Lily Allen?



Queria estar lá

Basta assistir aos três primeiros clipes para entender. Um bando de gente bonita e/ou sexy, cardápio variado de possibilidades. Enfim, o melhor, na minha opinião, do Pet Shop Boys (visitantes felizes do mundo particular do fotógrafo Bruce Weber), de Madonna (na fase de levantar bandeiras libertárias… que saudade!) e de Kylie (como sempre e como poucas, super lânguida e muito bem acompanhada).

Para o último clipe, no entanto, o desejo de fazer parte dele tem motivação diferente. O extinto duo dinamarquês Junior Senior convocou fãs de todo o mundo para que mandassem gravações, dublando sua canção. Sonho realizado para alguns: o clipe é uma compilação da aparição daqueles com melhor desempenho, que são vistos entre presenças pontuais de Jesper “Junior” Mortensen e Jeppe “Senior” Laursen.

Esta simpática proposta é somente mais uma das alternativas abertas pela relação entre o campo do videoclipe e o avanço da Internet, algo que inclui: 1) a ampliação do espaço de exibição, 2) o consumo liberado da veiculação televisiva e programado individualmente pelo espectador, 3) a distribuição alargada e 4) novas estratégias de criação, incluindo fãs e novos realizadores. Nesse último ponto, vale lembrar a iniciativa de artistas consagrados (como Björk, Keane ou Pato Fu) ao estimular espectadores a conceber ou realizar clipes para suas canções (alguns deles, sendo inclusive tratados como a versão videoclípica oficial).



Agridoce

Só para relembrar que – como todo trabalho artístico –, os efeitos videoclípicos podem ser diversificados. Dentre eles, a condução emocional – mesmo contida, melancólica – pode estar entre os mais memoráveis.




Direto ao ponto

Mais que um fã, sou um devoto de conceitos videoclípicos simples. Pena, por exemplo, que Michael Jackson não tenha ido mais fundo na versão clean orquestrada por Herb Ritts. No clipe, a construção de imagem do cantor parece-me muito bem resolvida. Eficientemente, o tom sépia estetiza sua almejada (mas nem sempre bem sucedida) aparência trans-étnica, sendo que, ao mesmo tempo, a realça pela comparação com a modelo Naomi Campbell. Além disso,  temos ali a lembrança de sua condição de dançarino especial, mas sem qualquer exagero: um Michael Jackson à vontade.

Em outros casos, a simplicidade vem burilada pela parceria prolongada entre diretores e artistas musicais. Cumplíces, Sophie Müller e Annie Lennox discutem, dentre outras coisas, a artificialidade inerente ao artístico. O que seria melhor, como ilustração disso, do que acompanhar a transformação de Lennox na diva de Why? Duradouras também são as colaborações entre Madonna e os dois diretores aqui indicados, Mondino e Akerlund, que  – cientes de sua atratividade na dança – investem em conceitos simples e/ou no despojamento de elementos.

Sem querer me alongar, resta sinalizar o quanto os clipes de Des’ree e do The Verve acertam em cheio no carisma dela e na atitude rebelde cool de Richard Aschcroft.



Uau!!

Precisa dizer mais?

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Produtora: Hide Park (França) – Clipe: My Eternity (Christophe Charrier/Benjamin Siksou, 2009)

O clipe I Want to Go Home (analisado no post anterior) foi feito pela produtora francesa Hide Park, uma subsidiária da empresa de criação audiovisual Troisieme Oeil Productions. Estão à frente da Hide Park o diretor Christophe Charrier e o produtor Pierre-Antoine Capton. Como de hábito no campo de produção do videoclipe, a empresa não se dedica exclusivamente à realização de clipes,  embora concentre sua atuação em formatos destinados à televisão (comerciais, documentários, making-ofs e programas, além dos vídeos musicais).

Além de I Want to Go Home, outro destaque videoclípico da Hide Park é My Eternity do cantor/instrumentista/ator Benjamin Siksou. Em 2008, o artista francês foi finalista do reality-show Nouvelle Star, o equivalente local do American Idol.

My Eternity é um veículo bastante apropriado para uma estrela francesa em ascensão. As influências musicais estadunidenses do soul, jazz e blues  tão apreciadas na França – são apresentadas como uma jam-session em torno do cantor, que, mesmo estilizada, quer nos lembrar da legitimidade musical do artista (cuja biografia indica uma dedicação precoce à música). Ao mesmo tempo, o clipe investe na boa pinta parisiense do jovem Benjamin, dando especial atenção para sua charmosa cicatriz no rosto. Cool!!



Site oficial da produtora Hide Park (www.hidepark.fr)

I Want to Go Home (Christophe Charrier/Alex Beaupain, 2009)


O videoclipe I Want to Go Home procura ampliar o tema de desencaixe presente na letra da canção. Para isso, a distância da figura amada e o conseqüente sentimento de inadequação ao entorno são retirados do contexto romântico e da cidade de Paris. Em sua singularidade de versos em inglês, o refrão oferece o mote principal para o clipe: Alex Beaupain repete o desejo de retornar ao lar, constata não ter mais para onde ir e, voilá, é mostrado vivendo em um asilo e participando plenamente da rotina de senhores e senhoras de terceira idade.

Investe-se, desse modo, em uma situação que, além de escapar aos lugares comuns dos clipes de amor, se passa em um ambiente passível de ser encontrado em diferentes países. A expressão emocional do cantor tem uma continuidade e está afinada com o desamparo dos velhos, que reflete o medo de terminar sozinho ou apenas afastado do que se foi ou se teve no passado. Por isso, é mesmo emocionante que eles assumam ocasionalmente a dublagem de trechos da canção, em que dizem “quero voltar pra casa” ou “certamente, você não me espera mais”.

Não é comum que a velhice seja tematizada nos videoclipes e, na minha opinião, I Want to Go Home faz isso de uma maneira não condescendente. A colocação de Beaupain entre idosos não pretende demarcar o quanto o artista é diferente deles; pelo contrário, sublinha que, eventualmente, todos podemos ter finais não ideais.

Adicionalmente, parece-me que o clipe faz referência ao recorrente sentimento de alheamento de mulheres e homens com relação às suas próprias conquistas. Em momento emblemático, Alex Beaupain canta “já passei por aqui (...) mesmo minha memória me deixa”, enquanto reconhece na TV um trecho do musical Les Chansons D’Amour (Christophe Honoré, 2007), para o qual ele compôs as canções. De certo modo, isso é tão melancólico quanto a velhinha que não consegue alcançar alguém pelo telefone ou o senhor que, sozinho em seu quarto, escreve até tudo ficar escuro demais.